Por Jarid Arraes
Novembro é oficialmente o Mês da Consciência Negra no Brasil. Apesar de ser importante e necessária, especialmente por se tratar de um país que teve séculos de escravidão de pessoas negras, essa data ainda é bastante incômoda para uma parcela da população. Mesmo assim, o mês de novembro mobiliza o movimento negro e desperta um interesse temporário nas escolas, instituições e noticiários, que costumam abordar o tema do racismo superficialmente no período próximo ao dia 20.
Novembro é oficialmente o Mês da Consciência Negra no Brasil. Apesar de ser importante e necessária, especialmente por se tratar de um país que teve séculos de escravidão de pessoas negras, essa data ainda é bastante incômoda para uma parcela da população. Mesmo assim, o mês de novembro mobiliza o movimento negro e desperta um interesse temporário nas escolas, instituições e noticiários, que costumam abordar o tema do racismo superficialmente no período próximo ao dia 20.
Aqueles que falam dessa data muitas vezes se recordam de
Zumbi dos Palmares, que é o grande ícone da luta contra o racismo por
sua resistência contra a escravidão. Mesmo na escola, muitos ouvimos
falar de Zumbi e aprendemos que ele foi líder do Quilombo de Palmares,
onde negras e negros que fugiam da escravidão podiam encontrar refúgio e
organização política. No entanto, pouquíssimos sabem de quem se tratava
Dandara dos Palmares, uma figura tão importante quanto Zumbi.
Dandara foi esposa de Zumbi e, como ele, também lutou com
armas pela libertação total das negras e negros no Brasil; liderava
mulheres e homens, também tinha objetivos que iam às raízes do problema
e, sobretudo, não se encaixava nos padrões de gênero que ainda hoje são
impostos às mulheres. E é precisamente pela marca do machismo que
Dandara não é reconhecida ou sequer estudada nas escolas.
Lamentavelmente, nem mesmo os movimentos negro e feminista mencionam
Dandara com a frequência que deveriam. De um lado, o machismo, que
embora conte com o trabalho árduo das mulheres negras, não lhes oferece
posição de destaque e voz de decisão. Do outro, o racismo, que só tem
memória para mulheres brancas.
Nós, mulheres negras, crescemos sem nos encontrarmos nos
livros de história, poesia, literatura ou sociologia. O machismo racista
da sociedade parece nos dizer que não temos o direito de encontrar
representatividade e inspiração para rompermos as amarras da
discriminação institucional. Muitas sabemos de Dandara e outras mulheres
negras importantes somente devido a nossas próprias pesquisas
solitárias, ávidas por descobrir. E, infelizmente, somos nós as mesmas
pessoas que lutam para que essas mulheres não sejam apagadas da
história.
Alguns pesquisadores, como o professor Kleber Henrique, que escreveu este belíssimo texto
sobre Dandara, evidenciam o papel dessa grande líder e falam de sua
sede por liberdade. Mas salientam que até hoje não se tem conhecimento
de como era o seu rosto ou de onde veio. Se Dandara fosse uma mulher
negra contemporânea, provavelmente seria mal vista por todos que se
negam a enxergar o racismo. Dandara não queria acordos pela metade e nem
se vendia em troca de libertação parcial. Morreu como a heroína que foi
em vida e, graças à sua luta, hoje temos força para continuar a batalha
contra o racismo brasileiro.
Portanto, me recuso a aceitar que Dandara seja figura
esquecida ou que continue sendo lembrada sob a sombra masculina de
Zumbi. A mulher negra quer e conquista seu espaço, pois tem força,
inteligência e capacidade para romper com paradigmas machistas e
racistas. O mês da Consciência Negra precisa ser cada vez mais o mês de
Dandara dos Palmares, da autonomia absoluta da mulher negra e da
completa liberdade feminina, que protagoniza as trincheiras da
resistência contra a discriminação por cor e gênero. Dandara vive.
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