Somos o Movimento Negro do Amazonas - coletivos, institutos, movimentos bem como
Povos de Terreiro de Manaus, aqui assinados, Fórum de Juventude Negra do
Amazonas, Instituto Ganga Zumba, , Mulheres de Axé, Instituto Cultural
Mutalembê, Associação Cultural Toy Badé, Associação Nossa Senhora da Conceição,
Coletivo Ponta de Lança, Movimento de Mulheres Negras da Floresta - Dandaras,
Terreiro de Santa Bárbara Seringal Mirim – Ilê Axé Opo Mesoan Orun; Crioulas do
Quilombo Urbano de São Benedito, Fórum Permanente das
Mulheres de Manaus – FPMM, Espaço Feminista URI HI, Ocupaminart, Favelafro,
Rede
de Mulheres Indígenas do Estado do Amazonas, Grupo de Capoeira Arte Revelação,
Escola de Capoeira Senzala, Federação Amazonense de Capoeira, FOPAAM
– Fórum Permanente dos Afro descendentes do Amazonas, Rede Nacional de Articulação
de Religião Afro Tradicional – REATA, RENAFRO – Rede Nacional de Religiões Afro
brasileiras de Saúde, UNEGRO – União de Negras e Negros pela Igualdade.
A partir do ano de 2010 quando a Lei 12288 foi
promulgada instituindo o Estatuto da Igualdade Racial, estamos lutando para a aprovação do Estatuto da Promoção
da Igualdade Racial em nosso Estado, mas até agora não obtivemos sucesso e
perdemos muitas oportunidades de melhorias para o nosso povo negro e indígena. Por
isso viemos a público:
1. Repudiar
ao racismo e intolerância religiosa praticados em reunião do dia 23 de maio de
2019 pelo grupo de movimentos que se autodenominam representantes de mestiços;
Os grupos autodenominados Fórum Nacional dos Mestiços,
Movimento Pardo-Brasileiro - Nação Mestiça e a Associação de Caboclos
Ribeirinhos da Amazônia - ACRA compareceram à reunião organizada pela Gerência
de Promoção da Igualdade Racial, representada pela senhora Francimar Santos
Júnior (Francy Júnior) e que tinha como pauta a Apresentação da Minuta do
Estatuto Racial e de Combate a Todas as Formas de Intolerâncias Religiosas do
Estado do Amazonas e a Apresentação da minuta do Edital de convocação para
composição do Conselho Estadual de Promoção da Igualdade Racial para inviabilizar
e prejudicar a reunião de todas as formas possíveis, levantando a voz em
diversos momentos contra vários membros do comitê, e até mesmo funcionários
membros da instituição, proferindo ameaças e criando um ambiente caótico para
todos os que ali se faziam presentes. Desde o início da reunião se colocaram
contra a apresentação da minuta mesmo antes desta ser apresentada e, diante de
sua apresentação, faziam destaques em todos os artigos e até mesmo títulos
procurando tomar o máximo possível de nosso tempo para assim inviabilizar que a
apresentação e posterior debate fossem concluídas com êxito. Para além disso,
ainda se utilizavam de qualquer brecha na fala de quem estivesse lendo a minuta
para interromper, muitas vezes aos berros, a leitura da mesma proferindo
discursos que desfocassem do objetivo comum que era o de apresentação da
minuta. Dentre as diversas situações lastimáveis as quais fomos expostos, ainda
tivemos de presenciar os crimes de racismo e intolerância religiosa contra o
Babalorixá Abner e a Yalorixá Janeth, dentre outras muitas situações de
violência de cunho racista e até mesmo que ferem completamente os princípios
democráticos de nosso país. Tornamos aqui público nosso repúdio e denunciamos
os crimes ali cometidos, que ocasionaram em diversos membros do comitê
adoecimento físico e psicológico, mediante todo o constrangimento e violência a
que fomos sujeitados.
A reunião do dia 23 de maio de 2019, que ocorrera das
14h às 17h, no auditório da Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e
Cidadania (SEJUSC) foi marcada por bate bocas, ameaças, gritarias, ofensas e
até mesmo tentativa de violência física contra uma das mulheres do comitê,
intimidando a todos ali presentes e gerando um ambiente de completa insegurança
e desconforto. São estes que se auto intitulam representantes de mestiços o
senhor Jerson Cesar Leão Alves, do Fórum Nacional dos Mestiços, a senhora Helda
Castro de Sá, do Movimento Pardo-Mestiço Brasileiro – Nação Mestiça e o senhor
Laucivanio Ramires de Aparicio, da Associação dos Caboclos e Ribeirinhos da
Amazônia – ACRA.
Em referência à primeira minuta, que tinha por conteúdo
o Estatuto de Promoção da Igualdade Racial, tanto o senhor Leão Alves como
Helda Castro e Laucivanio Ramires interromperam diversas vezes a sua leitura
com falas totalmente descabidas e que nada tinham a acrescentar ao debate, ao
contrário, colocavam em voga alguma discussão totalmente oposta a pauta da
reunião, afirmando, por exemplo, que um estatuto fora elaborado anteriormente e
que deveria ter sido aprovado, se referindo a um estatuto que fora arquivado, e
que neste procuravam se privilegiar como grupo acima dos povos e etnias
existentes no Brasil e que são reconhecidos legalmente em todo o território
nacional. Colocações como ‘’ História e Cultura dos Mestiços’’ e ‘’Terreiros
Mestiços’’ eram uma de suas alterações no antigo estatuto arquivado.
Alegando também ser aquela reunião uma perda de tempo,
ou que a aprovação da minuta poderia ser feita noutro dia, proferiam
reclamações em tom de confronto que culminavam somente em bate bocas, gerando
desgaste aos demais presentes. Fizeram-se cansativos, perturbadores e demasiadamente
estressantes.
Cabe ressaltar no
que diz respeito às interrupções e destaques demasiados, já citados
anteriormente, que essa atitude, de início, causou um profundo estranhamento,
no entanto logo fora percebido que o objetivo deles era o mesmo de reuniões
passadas: Desarticular e impedir o seguimento de mais um passo do processo de
garantia de direitos às populações negra e indígenas, bem como aos povos de
religiões de matriz africana.
Essas interrupções se manifestaram também através de
comportamentos inadequados e que ferem sobremaneira o direito ao respeito,
assegurado na Constituição brasileira. Isso se mostrou no momento em que a
professora Elizangela Almeida fazia a leitura da minuta e por questão de ordem
o senhor Abner da Silva Rodrigues, Pai Abner, Babalorixá designado como
representante do Ilê Axé Opo Mesan Orum, Terreiro de Santa Bárbara Seringal
Mirim, pediu a fala para nos alertar sobre o tempo que faltava para o fim da
reunião, que naquele momento era de quarenta minutos, e devido as diversas
interrupções e destaques estrategicamente excessivos feitos majoritariamente,
senão exclusivamente, pelos autodenominados representantes dos mestiços seria
impossível que a leitura e debate sobre a minuta fosse concluída. Foi sugerido, então, que os números de
destaques destes representantes fossem reduzidos por conta de toda aquela
situação ter tornado-se insustentável. E diante disso, o senhor Leão Alves levantou
o tom de voz dizendo que aqui não é uma ditadura e sim uma democracia, que não
somos a Venezuela e que o presidente não é o Maduro, deixando explícito que, de
acordo com sua interpretação, o que estava ocorrendo naquele momento era um ato
antidemocrático. Por fim, afirmou enfaticamente que era de direita, seu
presidente era o Bolsonaro, que era cristão, e que não gostava de comunistas,
acrescentando ainda que era obrigado
somente a tolerar e não a respeitar os praticantes dos cultos afro-brasileiros
e os comunistas. Extremamente ofendido e sentindo-se desrespeitado, Pai Abner respondeu-lhe
em tom altivo tomando posição como Babalorixá e como comunista, afirmou que ele
respeitava a ideologia política e religiosa do senhor Leão, e que o mesmo tinha
a obrigação legal de também respeitar a sua posição política e religiosa. A intolerância
religiosa do senhor Leão afetou a todos nós como movimento negro, e em especial
aos representantes de povos de terreiro como a Yalorixá Janeth, que ali se fazia
presente. O que presenciamos foi o desrespeito e preconceito escrachado ao qual
nossos povos de religião de matriz africana e o movimento negro como todo somos
sujeitados todos os dias. Pessoas que, partilhando da mesma lógica do senhor
Jerson Cesar Leão Alves, nos matam e destroem nossos templos e nossos sagrados tanto
fisicamente quanto simbolicamente, como nos ocorrera nesta reunião.
Não bastando todo o desgaste ocasionado pelos mesmos grupos
já citados, ocorreu também uma situação de tentativa de agressão física por
parte do senhor Laucivanio Ramires de Aparício - ACRA para com a representante
do movimento de mulheres negras e doutoranda no Programa de Antropologia Social
da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Luiza de Marilac Miléo Moreira,
quando esta procurou respeitosamente explicar aos representantes do Fórum
Nacional dos Mestiços, Nação Mestiça e ACRA o fato de não existirem as palavras
“mestiço” e “caboclo” na minuta do Estatuto de Igualdade Racial do Amazonas. A
doutoranda alegou que esse Estatuto não poderia divergir do Estatuto Federal, que,
por sua vez, não faz a inclusão dos termos assinalados anteriormente, tendo em
vista que o próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) não
utiliza esse tipo de classificação populacional, já que os termos “mestiços” e “caboclos”
não caracterizam etnia ou mesmo raça, e estariam contemplados, no entanto, na
categoria de grupos culturais regionais. (Precisamos também estar atentos ao
fato de que, aderindo a esses termos, estamos corroborando com todo o histórico
e projeto de invisibilização da presença negra no Amazonas, e comprando o
discurso do mito da democracia racial que se utilizou da mestiçagem para negar
o racismo estrutural que compõe as bases de nosso país.)
Prosseguindo ainda sua fala, comentando sobre a agressão
ao Babalorixá Abner e a Yalorixá Janeth, afirmou que aquela reunião não estava
de acordo com a propositura desejada, já que presenciamos uma situação de
intolerância religiosa. Porém, nem podendo terminar sua fala foi abruptamente
interrompida pelo senhor Laucivanio que se levantou e foi autoritariamente com
o dedo em riste em direção à senhora Luiza de Marilac M. Moreira,
interrompendo-a e afirmando aos berros que estava sendo ofendido. Diante desta
confusão, o prof. Nilton Costa rapidamente interviu e se colocou entre o representante
da ACRA e a senhora Luiza de Marilac, que acabou sendo impedida de concluir seu
raciocínio. Outros participantes do comitê também levantaram-se e prepararam-se,
a fim de intervir caso a tentativa de violência física se concretizasse, o que
gerou na senhora Luiza de Marilac Moreira, a sensação de perigo e
constrangimento público.
Portanto, repudiamos e denunciamos tais atitudes de
racismo e intolerância religiosa. Já aguentamos por muitos anos a mesma
situação em conferências e em outros eventos. São as mesmas pessoas querendo
atrapalhar o processo, dizendo claramente que “negros são escravos e que eles
são mestiços, pretos ou pardos” como gritavam em alto e bom som na reunião e
como está no site deles. Isso é uma
afronta ao Estatuto federal de Igualdade Racial Lei 12.288/2010 que busca a
promoção da população negra diante de toda a história de desigualdade racial e
da falta de oportunidades econômicas, sociais e humanas.
A referida Lei assim define a população negra:
IV – população negra: o conjunto de pessoas que se autodeclaram
pretas e pardas, conforme o quesito cor ou raça usado pela Fundação Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou que adotam autodefinição
análoga; (Lei 12.288/2010 – Estatuto da Igualdade Racial, TÍTULO I, DISPOSIÇÕES PRELIMINARES, Art. 1º)
Se esse o referido grupo de mestiços/pardos não aceitam
essa definição, por que insistem em estar no estatuto? Não é possível
compreender. Portanto, solicitamos que sejam tomadas medidas efetivas no
sentido de dar segurança jurídica às pessoas que foram agredidas e aos
representantes dos movimentos sociais que hoje, como sempre, foram ofendidas nos
espaços públicos.
2.
Solicitação de Revisão das Leis N° 3747 de
02/05/2012 que considera como Utilidade Pública, o Movimento Pardo–Mestiço Brasileiro
- Nação Mestiço, a N° 3044 de 21/03/2006 que institui o Dia do Mestiço e, por
último, a lei N° 3140 de 28/06/2007 que institui o Dia do Caboclo.
Nós, Movimento Negro do Amazonas, viemos a público
solicitar aos nossos deputados estaduais a
Revisão do texto das Leis supra citados pelas situações:
ü De
falta de fundamento teórico-científico;
ü Inconstitucionalidade
com o que preconiza a Lei 12.288;
Esta lei institui o
Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a
efetivação da igualdade de oportunidades,
a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à
discriminação
e às demais formas de intolerância étnica (TÍTULO I, DISPOSIÇÕES
PRELIMINARES, Art. 1º)
ü E
para que seja extensiva a todos os povos e comunidades tradicionais do Amazonas,
tais como os quilombolas e os grupos indígenas. E essa situação tem gerados
perdas significativas em todas as esferas, além de reforçar a desigualdade de
oportunidades no Estado;
ü Para
que não seja exclusividade apenas de um grupo que se diz grupo étnico;
ü A
Lei é discutível porque saberes acadêmicos responsáveis pela produção do
conhecimento sobre identidade étnica não endossam o que defendem o grupo
denominado mestiço e caboclo enquanto raça;
ü Solicitamos
ainda uma audiência pública para discutir a eficácia e os efeitos nocivos dessa
lei.
ANEXO
Acrescenta-se abaixo
algumas das falas nocivas partilhadas nas redes sociais, especificamente
Twitter e Facebook, pelo Nação Mestiça e pelo representante do Fórum Nacional
dos Mestiços, Jerson Cesar Leão Alves:
Fontes:
Figura 1 – O Sr. Leão é
contra a autodeclaração prevista na Lei 12.288 –Estatuto de Promoção da
Igualdade Racial.
Sobre esta imagem, partindo
de pressupostos nazistas cuja concepção se baseava em raças puras, o senhor Leão
deixa evidente em suas palavras que não respeita a auto declaração garantida
por lei, e que independente do fenótipo e leitura social/racial que seja feita
de uma pessoa isso se faz irrelevante, ofendendo a todos nós do movimento negro
e indígena.
Figura 2 – Renegam
a palavra NEGRO e demonstram falta de conhecimento científico
e das políticas
afirmativas brasileiras.
Figura
3: Negro significa escravo?
Sobre
as imagens 2 e 3: Percebe-se a concepção
racista, pois usam palavra escravo ou
negro para significar apenas que uma pessoa pertence a um senhor ou a uma
senhora. Usam a todo tempo termos racistas para se referirem às pessoas negras,
como por exemplo, no termo ‘‘mulato’’, subutilizado no racismo institucional ou híbrido.
Sobre isso, ver leituras como:
MOORE, Carlos. Racismo e sociedade: Novas
bases epistemológicas para entender o racismo. Belo Horizonte, Mazza edições,
2007.
FANNON, Franz. Em defesa da Revolução Africana.Ed.
Terceiro Mundo, 1980.
Figura 4:
Sobre
a figura 4: Os ataques também são para quem defende os indígenas comparando
esse conjunto de ideias e valores à concepções nazistas, portanto, propagando
ódio aos povos originários das terras brasileiras.
Figura
5:
Sobre a figura 5: As concepções
preconceituosas e intolerantes com relação a fé e crença que não se assemelham às
concepções do senhor Leão são evidentemente tratadas como “anormais”, não respeitando nem mesmo a Constituição que
nos garante um Estado Laico. Isso já nos explica de onde vem aqueles
comportamentos vivenciados na reunião do dia 23 de maio de 2019.
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